Os irmãos mais fofos da Argentina Franco e Benja
Os irmãos mais fofos da Argentina Franco e Benja

Argentina: o desconhecido que mora do nosso lado

Meu nome é Bruna Hamori e voltei da Argentina onde estava realizando meu intercâmbio social através da AIESEC Rio de Janeiro.

Os irmãos mais fofos da Argentina Franco e Benja
Os irmãos mais fofos da Argentina Franco e Benja

Alfajor e só.

Quando eu tinha 15 anos, fiz meu primeiro intercâmbio. Estudei um ano no estado de Michigan, Estados Unidos. Desde então, eu percebi como nos enganamos ao achar que conhecemos e entendemos a cultura de um outro país. Por mais que eu tivesse visto filmes, escutado músicas e lido livros, quando vivi lá, de fato, passei por diversas experiências que me fizeram enxergar que existe um oceano de diferença entre a cultura observada e a cultura vivida.

Quatro anos depois, após escutar tantas vezes que a Argentina e o Brasil são iguais (aliás, tudo é América Latina, não é mesmo?), resolvi aceitar o desafio. Comprei minha passagem para o dia 6 de Dezembro de 2014, pela qual paguei um pouco mais de 700 reais. Foi aí que tudo mudou. Menos de 30 minutos depois de ter chegado no aeroporto, Buenos Aires não era alfajor, não era a “Europa da América Latina”, não era Fernet, não era roupa barata e doce de leite com torrada no café da manhã. Buenos Aires era também abandonada, era medo, era ajuda, era meu lugar certo, minha hora certa, era a melhor versão de mim.

Crianças vendo vídeos sobre valores
Crianças vendo vídeos sobre valores

A viagem começou em Junho de 2014

Passei no processo seletivo para ser membro da AIESEC nessa época. Desde os meus 15 anos eu fazia trabalho voluntário mas, por algum motivo, esse parecia diferente. Quando entrei, não sabia ao certo o que era essa organização. Aliás, pensei que a entrevista era para viajar. Descobri no meio do processo que era para trabalhar e saí de lá torcendo para ser chamada. Fui comemorar em um bar quando me disseram que eu tinha sido aprovada.

Depois de 6 meses trabalhando na organização, conhecendo pessoas dos lugares mais doidos e remotos desse mundo, decidi que era hora de comprar a minha própria briga e me desafiei com essa viagem para a Argentina. Queria viver o outro lado da experiência que a gente tanto trabalhava pra entregar. E a Argentina era o lugar perfeito: passagem barata, podia praticar o espanhol – língua que estava estudando fazia um ano e meio -, e eu podia refazer o conceito do país na minha cabeça. Queria ter insights melhores que qualquer opinião sobre o alfajor ou doce de leite.

Como eu trabalhava na AIESEC, eu mesma pesquisei o projeto que eu queria e entrei em contato com as pessoas certas. Queria um projeto que ninguém pegava por ser em uma área de risco. Aqui no Rio, áreas como aquela, chamamos de cracolândia.

Essa versão Argentina era uma comunidade que se chamava Puerta de Hierro, no município de La Matanza (propício, não?). Ficava na província de Buenos Aires, mas não na capital. Aliás, sem trânsito, de ônibus, eu demorava por volta de uma hora e vinte minutos pra chegar na capital. Mas nem era tanto, vai! Aqui no Rio eu demoro mais que isso pra chegar na faculdade haha.

As crianças de Puerta de Hierro
As crianças de Puerta de Hierro

Atravessando o Portão de Ferro

Você deve estar morrendo de curiosidade para saber como é lá, né? Com certeza, não é comparável a nada que você viu antes. A nada que eu tinha visto. Essa é a beleza de realmente se dedicar a conhecer um país e adotar seus maiores problemas: você é surpreendido. Sempre.

A comunidade era abandonada pelo governo e, se não fosse, não faria diferença porque o estado não entra lá. Polícia não pode entrar. As pessoas andam com drogas e armas livremente pelas ruas. O trem leva e trás pessoas de diversas partes da província que vão lá comprar drogas no livre comércio. Duas a cada três pessoas vendem drogas na comunidade. As crianças tinham sérios problemas: eram violentas, carentes, desmotivadas. Mas claro, com o maltrato dos pais, o abandono ou até tendo que ver a mãe fazendo relações sexuais na sua frente com outros homens, não é de se admirar que sejam assim.

Ensinando Yoga para as crianças. Elas amavam!!!
Ensinando Yoga para as crianças. Elas amavam!!!

Tinha tiro todo dia. Toda noite. Eu e meus colegas de trabalho esperávamos o dia seguinte para saber se quem morreu era parente de alguma das crianças. Na maioria das vezes, era. E elas contavam com a maior naturalidade do mundo. “Bruni, ouviu os tiros ontem? Foi meu tio que mataram. Ele vendia droga”.

Ah, meus colegas de quarto! Morávamos juntos em uma casa do lado da ONG (que era a única ONG da comunidade inteira. Uma das maiores da província – curta a Fanpage). Morei com uma Colombiana, uma Mexicana, Costa Riquenha, um Belga, um Peruano e três Brasileiros. De lá, saíram meus melhores amigos até hoje. Moramos sem luxo, fazíamos nosso próprio lazer, sentimos medo de verdade pela primeira vez, sentimos a tristeza dos outros de verdade pela primeira vez. Moramos dois meses na verdadeira terra de ninguém. Terra onde era perigoso sair para comprar comida e comemos por dois dias pão duro com maionese, bebendo água da bica. Nos arrumávamos dentro do ônibus, porque chamar atenção no ponto era perigoso. E eu só pensava que era uma super experiência para mim. Claro, eu ia voltar. Algumas crianças nunca vão sair de lá.

Criança comendo o lanche na ONG
Criança comendo o lanche na ONG

O carnaval de Fevereiro de 2015

Voltei um pouco antes do carnaval aqui do Rio. Tive a chance de contar essa experiência pra muito amigos. Eles sabiam que existiam muitos projetos diferentes e que eu tinha escolhido um muito perigoso e difícil e ficavam assustados, com medo, falavam que eu era louca de ter feito isso. Mas louca? Eu? Queria poder dizer que eu fui pro lugar que mais precisava de ajuda. Que eu mudei a vida das crianças, ensinei valores, yoga, arte, esporte. Ensinei matemática. Ensinei que existem outros lugares além da comunidade em que eles vivem. Ensinei que existe Brasil! Ensinei que eles não são os únicos vivendo naquela situação. Ensinei que eles podem sair dela. Queria dizer que ajudei a ONG e, se eu não tivesse lá, a presidente não teria conseguido fazer nem metade das coisas que ela sempre quis fazer pelas crianças. Queria poder dizer tudo isso.

Não seria mentira, mas seria menos verdade do que dizer que eu aprendi MUITO mais, INFINITAMENTE mais do que ensinei. Fui ajudada muito mais do que ajudei. As crianças abriram os meus horizontes e me mostraram muito mais do que eu na vida vou conseguir mostrar a alguém. Eu era a única que precisava de caridade naquele lugar, no meio de 60 crianças. Eu era a única frágil que passou por teste de sobrevivência, de resistência, de empatia. Passei. E isso, senhoras e senhores, é a AIESEC. E é esse país desconhecido que mora do nosso lado.

Por Bruna Hamori

Bruna Picorelli Hamori tem 20 anos e é estudante de Engenharia de Produção no CEFET/RJ. É diretora de marketing da Start Up Responde Aí, site usado por mais de 500 mil alunos de exatas ao redor do Brasil e alguns países da África. Entrou na AIESEC do Rio de Janeiro como membro de projetos sociais em Junho de 2014 e deixou a AIESEC em Dezembro de 2015 como gerente financeira.

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2 Comentários

  1. Carolina alvarez

    Wow Bruna yo te conocí en una reunión en la fgv cuando yo hice el intercambio en río. Hasta el día de hoy había pensado que eras de argentina, en serio, pero que inspiradora experiencia! Motivante ante todo! Un abrazo gigante

    • Hola Carolina,

      Que bueno que te gusto la experiencia de Bruna para nuestro site. Voy compartir con ella su comentario.

      Abrazos.

      Juliana Paul Mostardeiro
      Fundadora Aqui é Assim

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